domingo, 27 de outubro de 2013

Famílias de crianças com síndrome de Down: sentimentos, modos de vida e estresse parental

Nara Liana Pereira-Silva, Maria Auxiliadora Dessen

Resumo

Considerando a importância de se conhecer os processos  familiares para a compreensão do desenvolvimento de crianças que apresentam deficiência, este estudo comparativo descreve aspectos do funcionamento familiar e do desenvolvimento de crianças com e sem síndrome de Down, destacando o modo de vida das famílias, o estresse parental, bem como as reações e os sentimentos dos genitores frente ao diagnóstico do filho com síndrome de Down. Participaram deste estudo dez famílias compostas por mãe, pai e filhos morando juntos; cinco delas com uma criança com síndrome de Down. As famílias foram visitadas ao longo de dois anos, em intervalos de seis meses, sendo administrados questionários, entrevistas semi-estruturadas e uma escala de estresse parental a pais e mães. Os resultados mostraram que a rotina das famílias foi similar e que mães de crianças com síndrome de Down apresentaram índices mais elevados de estresse que mães de crianças com desenvolvimento típico. Os dados sugerem similaridades nos modos de vida das famílias e diferenças no estresse parental, que precisam ser exploradas mais detalhadamente.
Palavras-chave: síndrome de Down; famílias; crianças pré-escolares; estresse parental.

Portadora da síndrome vai continuar com seu trabalho com crianças
Paola supera Down e ignora o prazo para se aposentar

"Vamos, Alexandre. Coragem." Maria Paola Del Carlo segura o menino, que tenta levar um carrinho de supermercado de brinquedo durante a hora do recreio na Instituição Beneficente Nosso Lar, zona sul de São Paulo.
Alexandre, 16, tem síndrome de Down. Maria Paola, 47, também. Na sexta, ela fez 30 anos e 12 dias de ajuda a crianças deficientes. Pronta para se aposentar, é o 1º registro de portador da doença a completar o tempo de contribuição, segundo a Previdência.
Paola é também exceção no quadro de inserção de deficientes no mercado, onde a minoria das empresas cumpre a lei que as obriga a dar até 5% dos cargos a pessoas reabilitadas ou deficientes. A questão será alvo de debate nesta semana, em que comemora-se o Dia Nacional de Luta da Pessoa Portadora de Deficiência.
Um estudo feito pela Delegacia Regional do Trabalho de São Paulo mostra que, só no Estado, 101.953 deficientes ainda estão fora do mercado de trabalho e têm direito a um emprego.
Para o geneticista Décio Brunoni, Paola é vitoriosa também pela evolução da doença, o mais comum defeito genético ligado a problemas mentais, que, em muitos casos, traz problemas incompatíveis com a vida ao nascer. Mais tarde, pode gerar complicações cardíacas e leucemia. Na idade avançada, é associada, freqüentemente, a um maior número de casos de demência.
"Provavelmente, ela não nasceu com grandes anomalias. Naquela época, a possibilidade de uma criança com Down morrer era de 50%. Ela é uma sobrevivente", diz o médico da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).
"Quero continuar a trabalhar", diz Paola, que ajuda as crianças a ler livros, a montar brinquedos e a fazer exercícios de estimulação no lar beneficente, onde também foi assistida quando criança.
Thiers, 76, o pai de Paola, decidiu só pedir em janeiro o benefício para a filha, que começou no lar como "fadinha" (fazia pequenos serviços). "Aprendi com minha mãe, que fez isso para mim. Fui muito estimulada", explica ela enquanto auxilia Ailton, 11, nos exercícios.
Um luminoso condenatório
Thiers e Neide, 73, a mãe, citam hoje com desdém -mas já foi com muita raiva- o que uma psicóloga disse: Paola levaria para sempre "um luminoso" com a frase "retardada irrecuperável".
"Os médicos não sabiam de nada", diz o administrador de empresas Thiers. Ele encontrou outro profissional, que trouxera dos EUA um método de exercícios pesados de estimulação. A dedicação exclusiva gerou progressos: amarrar o sapato, distinguir esquerda e direita. "Cada conquista dela era uma coisa tão incrível..."
Brunoni diz não haver comprovação de que um método de estimulação é melhor do que outro. Certo é que as pessoas que são estimuladas têm grandes chances de ter uma vida mais saudável.
Thiers e Neide decidiram empregar energia no lar. Levaram o método de estimulação e até hoje participam de todas as atividades -ele na administração, ela dando aulas de costura para as mães.
O que a família não viu foi a filha na escola regular. "Professores e escolas não estavam preparados", diz Neide. Nem estão. Hoje ainda a maioria das crianças deficientes não estuda em escola regular, com todos os alunos, por falta de preparação desses locais.
Paola, alfabetizada no lar, hoje lê avidamente as revistas de novela após cumprir seu meio expediente. Piano e teclado também são de seu interesse -só músicas românticas. Teatro também. Ídolo é o irmão, o desenhista, ilustrador e animador Flávio Del Carlo. "Meu irmão é amor eterno."

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